segunda-feira, 5 de setembro de 2011

A Noviça e a Sacerdotisa

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Audrey Repburn - google imagens
Quarta-feira, pico da semana. O dia estava muito frio e eu muito apressada para chegar ao evento sobre sustentabilidade. 
Dentro do metrô lotado, com destino à Barra Funda, observava as pessoas e imaginava suas vidas, seus destinos, o quanto a vida é sofrida, e também produtiva, única, pessoal, daquelas pessoas que compartilhavam o espaço pequeno junto comigo. Consegui sentar num assento perpendicular à uma noviça.

Não pude deixar de notar suas vestes ou hábito de noviça:  marrons, limpas, longas, com blusa de lã por baixo, do mesmo tom das roupas, que tiravam-lhe todas as formas femininas,  dando para ver somente seu rosto e mãos jovens, delicados, de pele muito branca. Mãos que ela levava constantemente em seu nariz travando uma batalha entre o lenço de papel e os espirros.
De vez em quando ela "brincava" com o cinto que parecia ser de corda, com missangas marrons, feito de sementes, tudo natural.
Pressenti (talvez com o coração de mãe) que ela estava um pouco debilitada. 
Seus cabelos cobertos por um pano comprido, escuro, desbotado, puído, me remeteu ao fato dela possuir o voto de pobreza.
Quando me encontro com alguém assim, aparentemente frágil, seja homem ou animal, ou vegetal,  costumo fazer minhas preces em silêncio,  para ajudar, tentando distribuir preces e amor naquele ser. Isso faz com que nos alinhamos ao Divino (pelo menos na minha religião, acredito que em outras também).  É uma mania que tenho, transformo o aparentemente mundano em sagrado, e que se fixou mais ainda depois que me tornei uma sacerdotisa, como se eu fizesse parte da "corrente do Bem". Penso dentre outras coisas,  que ela poderia ser minha filha,  minha irmã etc. E um pouco de amor e oração a quem quer que seja, é sempre bom. 
Ao pedir por ela pensava: Deusa ajude esta menina, tão novinha, debilitada,  que está perto de mim. Traga a cura e a saúde para ela, traga-lhe força!
Imagino que a Deusa (Deus para muitos) deve ter pensado: - Elaine você quer desejar  a ela pessoalmente? Então fale diretamente a ela.
Quase imediatamente e simultaneamente,  o metro parou numa estação e ela deu um sonoro espirro. Tentando conte-lo com o lenço de papel quase sem sucesso, olhou para mim e deu um sorriso divertido,   e pude ver seus belos dentes jovens e o dialogo foi o seguinte:

- Estou com "a" gripe.
- É eu notei, precisa tomar vitamina C menina,
- Já tomei, estou muito debilitada, estive até em coma! Estava na Africa e tive que voltar ao Brasil às pressas para me tratar, pois minha imunidade caiu bastante.
- Precisa se cuidar, insisti
O metro chega até a Barra Funda, nos levantamos e eu não pude deixar de perguntar: 
- Estava trabalhando com crianças?
- Estava sim, e elas precisam de tantas coisas...estão tão doentes...tão fracas...
Percebi, então, o quão difícil deve ser comer e se cuidar quando vemos (e sentimos) tanta pobreza e miséria. Ou seja, abrimos mão de nosso ego nossas necessidades,  para a compaixão.
Essa noviça, pensei comigo, é uma heroína. Uma santa, uma deusa, poço de bondade e compaixão para com o outro. 
Continuei aconselhando:
- Então durma bem, alimente-se bem, fique forte para aproveitar nova oportunidade.
Sabia, por palpite ou intuição que essa era a vontade suprema dela: voltar para Africa, para ajudar aquelas crianças. Enquanto saíamos do trem, subíamos as escadas em direção à saída, ela comentou:

- Ah! Sim, voltarei já na próxima semana. A senhora sabe onde tem uma bilheteria?
- Olhei ao redor e localizei uma atrás de nós.
- Ali, apontei para ela.
- E após um sorriso, me agradeceu.
- Cuide-se. (Não tive coragem de verbalizar, pois acho que faria chorando): Estarei rezando por todos vocês.

 Afastei-me com direção ao meu destino. E agradeci à Deusa  pela oportunidade de começar o dia dessa maneira!

7 comentários:

Heloisa de Mesquita Inoue disse...

Bem... cada um de nós tem seu caminho... e, muitas vezes nos esquecemos que só podemos cuidar de alguém, se antes de tudo, cuidarmos de nós! Boa semana!

RUTE disse...

Que lindo texto Elaine.
Parecia que estáva lendo um livro.
Você escreve muito bem, ou então, é porque escreveu com coração e inspiração divina.

Este texto tem um enlevo especial. Distingue-se dos outros, também bons, mas não tão especiais.

Sei precisamente o que vc sentiu quando viu a moça debilitada. Acontece-me muito isso, querer ajudar desconhecidos quando noto que estão com baixa força animica.
Beijinhos querida.
Continue enviando boas energias para todos mas não descuide das suas também.
Esse episódio pode ser um alerta pra você :)
Rute

remall disse...

precisava desse texto para me lembrar de cuidar de mim mesma nesse momento tão delicado que estou vivendo. adorrei!

sobre as fotos das orquídeas é só clicar em cima delas que ficam maiores e se clicar de novo ficam maiores ainda hhehehehe, obrigada pela visita.

Elaine Figueira disse...

Rute, Remall, obrigada pela dica, preciso mesmo me cuidar. Aliás já estou me cuidando depois disto.

Cláudia disse...

Olá

Obrigado pelo teu comentário =)

Também já estou a seguir o teu cantinho, pareceu-me muito interessante =)

Beijos

soninha disse...

Uma experiência-vivência, maravilhosa.Deus te abençoe.PAZ!

Mírian Martins disse...

Oi Elaine!!
Simplesmente adorei o seu recadinho lá no blog!! O carinho com que vc escreveu "vc voltou, vc voltou"...não tem preço!!!!!
Pois é amiga, tantas coisas aconteceram, umas boas outras ruins, mas a vida é assim mesmo. Aqui em casa estamos todos bem graças à Deus.
Queria te dizer o quanto seu recadinho me fez feliz. Obrigada de coração por esse carinho.
Sinta se abraçada nesse momento.
Adorei dar umas bordejadas pelo seu blog.....me inspirou!!
Beijo grande.